Neste texto, abordaremos o luto de parceiro(a), ou seja, o luto da esposa, o luto do marido, o luto do(a) companheiro(a) que fica.
Cada pessoa vive o luto de uma forma única e nenhuma experiência de perda é igual a outra. Mesmo em meio a tantas diferenças, alguns pontos de semelhança podem ser destacados para ajudar a compreender melhor o processo de perda e luto de um parceiro ou de uma parceira de vida.
Perder alguém que você escolheu para dividir sua vida após deixar a casa dos pais é uma experiência de intenso sofrimento. Tornar-se “ímpar” depois de ter sido “par” é um aprendizado difícil em qualquer circunstância e em qualquer momento da vida.
Por que o luto por um parceiro ou parceira de vida é tão intenso?
1- Vocês compartilhavam assuntos importantes:
Depois dos pais, uma das pessoas com quem mais dividimos assuntos importantes são os companheiros de vida: assuntos financeiros, cuidado com os filhos, problemas na família, assuntos de saúde e trabalho, coisas sobre a rotina da casa e da vida. É certo que estes assuntos importantes faziam parte das conversas, mesmo que vocês não concordassem um com o outro sobre algumas coisas. Possivelmente você esteja se sentindo muito só neste tipo de conversa.
Para te ajudar: De fato, boa parte destes assuntos terão que ser administrados por você mesmo por um tempo, mas não será necessário cuidar de tudo sozinho. Lembre-se que você não compartilhava estes assuntos com outras pessoas porque tinha seu companheiro(a), mas na ausência dele ou dela você pode descobrir que existem outras pessoas confiáveis, familiares e amigos que possam caminhar mais perto de você e te ajudar em alguns assuntos.
2- Vocês compartilhavam o mesmo espaço:
Provavelmente sua casa está impregnada de lembranças difíceis: o lugar do sofá, a cadeira da mesa de refeição, o lado da cama, o guarda-roupa, dentre tantas outras. Em cada canto há a presença do seu parceiro de vida, vestígios e histórias sobre objetos e ambientes.
Para te ajudar: Ao mesmo tempo que essas lembranças podem tornar muito dolorosa a presença no ambiente, para outras pessoas pode ser acolhedor estar perto de tudo que representa o companheiro(a). Não há consenso sobre permanecer na mesma casa ou se mudar, sobre tirar as lembranças do ambiente, sobre esconder as fotos. Cada pessoa viverá estas lembranças de forma única e a decisão dependerá do quanto estas lembranças lhe acolhem de alguma forma ou lhe atormentam.
3- Vocês conviviam em intimidade:
Acredite, você vai sentir falta até dos defeitos do seu companheiro de vida! Conviver com alguém na sua intimidade é também lidar com os problemas que essa convivência diária trazia. Você vai se lembrar de frases sempre repetidas, vai se lembrar de reclamações feitas, de coisas pelas quais vocês discutiam, vai se lembrar de manias e hábitos. E isso pode ocorrer muitas vezes ao dia. Até que você construa outras memórias ao longo desta nova vida, na qual seu companheiro(a) não está mais presente fisicamente, você recorrerá às memórias da vida que vocês
Para te ajudar: Memórias também são legados! Você pode se entristecer pela lembrança, mas procure celebrar o fato de ter vivido estas coisas. Se estiver doendo muito, procure se distrair um pouco, mas não fuja das lembranças o tempo todo. Reserve um lugar especial em seu coração para estas recordações construíram juntos.
4- Você se sentirá mais responsável pela vida que construíram juntos:
Se vocês tiveram filhos, netos, se tiveram animais, se fizeram planos para o futuro, se construíram uma vida juntos, ela agora caberá somente a você e isso pode gerar insegurança e sofrimento. Esse aspecto do luto de parceiro(a) pode parecer pesado em um primeiro momento. Você nunca vai encontrar alguém que poderá substituir integralmente esta pessoa, ela era única e tinha um jeito próprio de ser. Contudo, você poderá reorganizar suas decisões, contando com a ajuda de muitas pessoas de sua rede de apoio.
Para te ajudar: Você pode descobrir um amigo com o qual pode falar sobre finanças, pode contar com a ajuda de um vizinho para o cuidado dos animais, pode descobrir que parentes estão dispostos a te ajudar com parte das tarefas com que você não sabe ou não consegue lidar. Talvez você não vá tomar as mesmas decisões que tomavam juntos. Mas entenda que mudanças aconteceram e hoje é você que está vivendo a situação em um cenário diferente do que vocês estavam. É possível que muitas coisas tenham que ser pensadas de forma diferente. Embora seu companheiro(a) não esteja mais nesta vida, estamos certos de que você o(a) conhecia bem, que será capaz de imaginar quais conversas vocês teriam sobre algum problema a ser decidido. Procure emprestar sua voz a ele(a) e tentar responder a si mesmo o que ele(a) diria sobre esse problema, considerando este novo cenário.
5- É difícil ver o sofrimento dos filhos:
Ao perder um companheiro(a) de vida com o qual você tinha filhos, seu sofrimento será duplo: por si mesmo e pelo luto de seus filhos. Não será possível poupá-los do sofrimento de perder um genitor. Não tente compensar a dor com presentes ou com falta de limites, na intenção de amenizar o sofrimento. Infelizmente seus filhos terão que viver seus próprios lutos, mesmo que você deseje ardentemente retirar esta dor do peito deles.
Para te ajudar: Seu desafio neste momento será conseguir se organizar para dar andamento ao desenvolvimento da família e manter viva a história do seu parceiro(a). Como orientam nos aviões, o correto é colocar a máscara de oxigênio em você primeiro para poder conseguir ajudá-los, ou seja, cuide de si mesmo, procure cuidar do seu luto, ir retomando a vida para que eles possam contar com você. Haverá muitos momentos nos quais os parceiros farão falta e ninguém poderá substituí-los. Mas a memória deles poderá ser honrada por meio de histórias familiares, objetos guardados, fotos que recontam a história da família quando estavam presentes. Homenageá-los é também uma forma de os manter vivos.
6- Vocês eram uma dupla:
Independentemente do tempo que permaneceram juntos ou de como dividiam a vida, vocês eram reconhecidos como um casal. As pessoas que perdem o parceiro(a) costumam se sentir deslocadas socialmente, principalmente diante de outros casais. A sensação de estar só pode ficar intensificada quando você vê outros casais e é comum que evite eventos dessa natureza. Aprender a ser uma dupla também deve ter sido um árduo processo, desde quando vocês se conheceram. Brigas, discussões, alguns desentendimentos, manias e hábitos diferentes são obstáculos no aprendizado da convivência a dois.
Para te ajudar: Entenda agora seu processo acontecendo ao contrário: você vivendo muitos obstáculos no processo de aprender a ser um só. Aceite que você terá um novo cenário e tenha paciência consigo mesmo. Quando estiver muito difícil conte com a companhia de amigos, parentes e pessoas próximas até que você se sinta seguro(a) para estar só nos momentos que vocês estariam juntos. Esta nova identidade será construída gradualmente e de forma lenta. Procure não se isolar socialmente como forma de se defender da dor, dê chances a vocês mesmo contra a solidão.
Fruto de uma história de amor.
O luto de um parceiro de vida é, acima de tudo, fruto de uma história de amor. A despeito de todas as dificuldades, é importante que você saiba que não precisa encerrar esta história: você seguirá com ela dentro de você para sempre.
Este texto foi desenvolvido pelo Centro de Psicologia Maiêutica em colaboração com o Grupo Cerejeiras.