memorias ao vento

Memórias ao vento: lembrar para não esquecer.

Se buscarmos o significado da palavra “finados” chegamos ao verbo “finar” (do latim “finis”), encontraremos as seguintes definições: acabar, finalizar, encerrar. 

Mas será que é possível encerrar um vínculo de amor? Como diz o poeta português Miguel Esteves Cardoso: 

Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente, como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa, como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está?

Essas são algumas das inúmeras perguntas feitas por quem está vivendo o rompimento de um vínculo significativo causado pelo falecimento de um ente querido, independente do tempo transcorrido. 

Vamos conversar um pouquinho sobre isso?

A intensidade do luto: impacto arrebatador das emoções.

Por mais que saibamos que a morte é algo intrínseco à vida, sua chegada ainda nos pega de surpresa. 

Os enlutados relatam que, ao serem comunicados do falecimento, é como se em um segundo o relógio o mundo virasse de cabeça para baixo e uma montanha-russa de sentimentos surgisse, trazendo revolta, medo, tristeza, insegurança, ansiedade, raiva, descrença, indignação, apatia, impotência, dificuldade de concentração, solidão, entre muitos outros.

Por essa razão, os especialistas em luto vêm apontando a necessidade de reconhecer as particularidades e individualidades desse processo. Cada um se aproxima e lida com a morte usando os recursos desenvolvidos ao longo da vida e com a história e a memória construídas com o ente querido. 

Por vezes são lembranças dispersas, esquecidas, como memórias ao vento.

Ou seja, todos sofrerão com tamanho impacto, mas a diferença está em como cada um lidará com esse momento.

Alguns podem buscar refúgio em rituais tradicionais de despedida, como velórios e funerais, encontrando conforto ao seguir as etapas que simbolizam a passagem da vida para a morte. 

Outros, no entanto, podem preferir se afastar desses ritos, optando por momentos mais privados de luto e reflexão. 

Além disso, há quem encontre na arte, na escrita ou até mesmo em atos de caridade formas de canalizar a dor, transformando-a em algo que traga significado ou que ajude a preservar a memória do ente querido. 

Independentemente da forma de enfrentamento, o que é fundamental é o reconhecimento de que não há um “certo” ou “errado” nesse processo. Cada passa pelo luto à sua maneira, e respeitar essas diferenças é essencial para oferecer o suporte adequado.

Sabemos que o luto não passa, nós é que passamos por ele. Ele é companhia eterna, porém a dor e o sofrimento não precisam ser. 

Permita-se transitar pela tristeza quando precisar, mas o importante é não fazer dela um lugar permanente.

O luto não precisa e não deve ser enfrentado sozinho.

Se você está vivendo uma perda, busque ajuda, se cuide, pois o luto é como um machucado que precisa de curativos permanentes. 

O enlutado costuma ter muita dificuldade de pedir ajuda. Muitas vezes, ele fica esperando o outro perceber suas dores e dificuldades. Não esqueça que a dor é sua e só você sabe o tamanho dela.  

Busque amigos que possam ouvir sem julgar o seu momento, ou procure grupos de apoio ao luto para compartilhar seus sentimentos e se sentir acolhido. Dê palavras à tristeza, porque o pesar que não se fala endurece o coração já tão sofrido.

Por outro lado, se você está acompanhando alguém que está vivendo um luto, se ofereça para fazer coisas práticas coisas do dia a dia: uma comida, um supermercado, uma farmácia, um pagamento. 

Essas ações práticas ajudam porque, do lado de fora, a rotina parece continuar normalmente, com as mesmas exigências diárias e a aparente normalidade do mundo ao redor. No entanto, para quem está passando pelo luto, essa continuidade pode soar dissonante, quase cruel num primeiro momento.

Às vezes, um simples abraço, o silêncio e a paciência para o outro falar podem ser muito significativos nesse processo. 

O que mais importa é ajudar para que o enlutado consiga criar um ciclo de adaptação e recomeço, no qual aprenda a viver com o que foi perdido, mas também com o que ainda há pela frente.

Já dizia o poeta: “a saudade é o amor que fica”.

Estamos nos aproximando de um período de muitas datas difíceis para quem perdeu um ente querido: finados, natal, ano novo. 

Essas reuniões costumam ser disparadoras de lembranças: leia nosso artigo Luto e Natal: o impacto das festas de final de ano no processo de luto das famílias sobre esse tema. 

Desse lugar de memórias e histórias é que eternizamos nossos amores, justificando, inclusive, nossa saudade que, como nos faz lembrar Lu Oliveira, “saudade tem nome e sobrenome, tem cheiro, tem cor, textura e gosto. Saudade é a vontade que não passa. É a ausência que incomoda”. 

Ao contrário do que se imagina, saudade não é falta, e sim a presença da lembrança, é a prova viva do amor. Aqueles que amamos não morrem nunca, eles vivem eternamente em nossa memória, enquanto forem lembrados e celebrados. 

Assim, vamos fazer dessas datas uma coleção de lembranças dos nossos amores e, se a saudade surgir, é a prova de que tudo valeu a pena.  

Qual o nome de sua saudade? 

Quais são as lembranças que você guarda desse amor? 

Quais memórias ao vento você consegue alcançar?

Se você quiser saber mais das ações de apoio ao luto que o Cerejeiras disponibiliza aos familiares de forma gratuita, entre em contato conosco pelo (11) 4040-5550 e se informe da programação. 

Este texto foi desenvolvido pelo Centro de Psicologia Maiêutica em colaboração com o Cerejeiras

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Foi lançado recentemente um importante livro no campo da Tanatologia, área de estudo científico sobre a morte. 

“Amor e Perda: as raízes do luto e suas complicações” é uma obra de Colin Murray Parkes, conceituado pesquisador da área, cujas contribuições são de inestimável valor para os profissionais que lidam direta ou indiretamente com os temas de luto e perdas. 

Na introdução, Colin nos lembra que, se o amor, laço psicológico que vincula uma pessoa a outra, é a fonte de prazer mais profunda na vida, a perda daqueles que amamos é a mais profunda fonte de dor. 

Administrar o amor parece tarefa fácil, mas como dar conta da dor de um rompimento amoroso, de um laço afetivo intenso

Nossa experiência com famílias enlutadas tem nos ajudado a compreender quão complexa e desorganizadora é essa vivência. Não há um conjunto de regras que possa sinalizar os procedimentos a serem tomados, já que o luto é um processo individual, de tempo indefinido e com manifestações das mais diversas possíveis. 

O que é sabido, contudo, é que muitas mudanças acontecem do lado de dentro e do lado de fora de cada um. A construção de uma nova identidade, sem a presença da pessoa amada, vai demandar um tempo psicológico que é muito diferente em seu mecanismo interno do tempo cronológico do relógio.   

O próprio Freud, em sua obra “Luto e Melancolia”, cunhou o termo “trabalho de luto”, entendendo que essa vivência requer uma elaboração psicológica e um longo processo de reorganização.  

O “start” desse processo se dá no contato da pessoa com a realidade da perda, ou seja, com a notícia da morte, com a preparação da cerimônia de velório e sepultamento. No contato com o corpo, com o sentimento de ausência e de irreversibilidade da morte, o enlutado começa o seu trabalho de luto. 

Aceitando a realidade da morte.

A tarefa inicial é aceitar a realidade da perda. Enfrentar essa ideia exigirá uma luta grande entre o real e o imaginário. 

Pode acontecer de alguns enlutados ficarem fixados na ideia de que o falecido está apenas viajando. É igualmente frequente ouvir os familiares se referirem a ele usando o tempo presente em vez do pretérito, assim como a procura por seus objetos, cheiros, fios de cabelo ou última roupa usada. 

Sabemos que esses mecanismos trazem um conforto psicológico temporário, mas só postergam a aceitação da realidade, que será inevitável em algum momento.

Aceitar a realidade da morte de um ente querido é crucial para o processo de luto e para a recuperação emocional. Essa aceitação permite que o enlutado comece a confrontar e processar a dor, ao invés de permanecer em negação, o que pode prolongar o sofrimento e dificultar a cura. 

Reconhecer a perda é o primeiro passo para integrar a experiência na própria vida e encontrar um novo sentido sem a presença física do ente querido.

Além disso, essa aceitação ajuda a pessoa a adaptar-se às mudanças, a redefinir suas rotinas e a construir uma nova rotina. Também facilita o recebimento de apoio emocional e prático de outras pessoas, permitindo que a dor seja compartilhada e aliviada. 

Em última análise, aceitar a realidade da morte é fundamental para honrar a memória daquele que partiu, encontrar a paz interior e seguir adiante com a própria vida.

A necessidade de expressar a dor.

Aliada a essa difícil constatação da perda e da ausência, outro trabalho se faz necessário: o exercício de expressão da dor. 

Enfrentar esses momentos exige canais de expressão que nem sempre são utilizados pelo enlutado. Estudos científicos apontam para o grande ônus físico e mental de reter e conter sentimentos. Mais especificamente, na área da psicologia, é sabido que sentimentos que não têm expressão tornam-se fermento para a depressão.

Assim, é importante que o enlutado encontre um modo de manifestar suas emoções, a fim de ajudá-lo na ressignificação dos seus sentimentos. Isso pode ser feito de diversas formas, como em conversas com amigos e familiares, participando de grupos de apoio ao luto, ou até mesmo se engajando em atividades criativas como a escrita, a arte ou a música. 

Expressar os sentimentos de maneira saudável permite que o enlutado libere a dor acumulada e comece a entendê-los melhor, além de se reorganizar nessa nova etapa de sua vida. 

O papel fundamental da reorganização no processo de luto.

Por fim, o enlutado é impelido a ajustar-se ao novo meio ambiente, a se reorganizar emocionalmente e continuar sua vida, agora sem a pessoa que amou - tarefa de grande monta que implica em encontrar outro lugar simbólico para a pessoa falecida. 

Dizemos que o momento de um equilíbrio suportável é quando o enlutado passa a não morrer de saudade, mas a viver a saudade

Como vimos acima, o início do processo de luto se dá com a notícia da morte, com a preparação da cerimônia de velório, do sepultamento ou cremação, e com o contato com o corpo. 

À medida que o tempo passa, é importante começar a redefinir as rotinas diárias. Manter-se ocupado com atividades cotidianas e novos hobbies pode ajudar a preencher o vazio deixado pela perda. 

Não é necessário dar um passo grande logo de início: pequenas metas diárias são o suficiente para ir se reorganizando durante esse processo.

Encontrar maneiras de homenagear a memória do ente querido, como criar um memorial ou dedicar tempo a uma causa que era importante para ele, também pode proporcionar um sentido de continuidade e propósito.

Não parece nada fácil lidar com as perdas e viver um luto. Mesmo sabendo que a morte faz parte do ciclo da vida, insistimos em não arquivar essa verdade em nossos vínculos e em nossas relações amorosas. 

Por isso, somos tomados por tanto sofrimento quando a natureza nos lembra que somos parte dela. 

Este texto foi desenvolvido pelo Centro de Psicologia Maiêutica em colaboração com o Cerejeiras

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